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"A Luta das Classes na História"

 

Todas as sociedades humanas têm tido por base o antagonismo das classes. Em todos os tempos uma classe privilegiada, teocracia, aristocracia, ou mesocracia, viveu à custa do trabalho de outra classe, escrava, serva ou proletária. E apenas nas tribos selvagens que vivem da caça e dos frutos naturais é que se acha a igualdade social e individual.

 

Todas as classes reinantes foram úteis na sua origem. Na Idade Média os nobres eram os defensores dos seus servos. Mas pelo desenvolvimento mesmo da sociedade, a classe superior perde a sua utilidade, e deixando de exercer uma função social, não pensa mais do que em conservar os seus privilégios, que oprimem com o seu peso a classe produtora. Para os conservar, recorre à força brutal; organiza exércitos e polícia, e não desdenha a força intelectual: a religião, produção espontânea do sentimento popular, adquire nas suas mãos uma forma dogmática, e vira-se contra o povo; o mesmo acontece com a ciência, com a filosofia, com os preconceitos e as tradições. O poder político é constituído pela união d’estas duas forças, de que se apossa a classe privilegiada, e que ela volta contra a classe oprimida. Porém, no seio da classe privilegiada existe a desorganização. A concorrência, as grandes empresas industriais e financeiras são as causas desorganizadoras da burguesia; as lutas intestinas dos senhores feudais, as cruzadas, as expedições feudais, foram as causas desorganizadoras da aristocracia. À medida que a classe reinante se desorganiza, cresce em número e em força a classe oprimida. Enquanto o patriciado romano se gastava em rivalidades mesquinhas, a plebe engrandecia, a escravidão generalizava-se, invadia as cidades e os campos, e fazia tremer Roma pelas revoltas na Sicília e no sul da Itália. Enquanto a nobreza europeia perdia a sua virilidade nas cortes dos reis, a burguesia enriquecia e invadia todas as funções úteis do estado. Nos nossos dias, enquanto a burguesia se atrofia nos prazeres e na ociosidade, o proletariado organiza-se, funda vastas associações internacionais, que abalam a velha sociedade até aos alicerces.

 

Ao passo que a classe dominante enfraquece, que o desenvolvimento da classe oprimida se torna um perigo para os seus privilégios, sente dominá-la o terror, e abre então os braços aos salvadores providenciais. De ordinário estes salvadores são aventureiros sem princípios, servindo não o seu partido, mas apenas o seu próprio interesse. Produtos da luta das classes, não podem conservar a sua elevada posição, senão fomentando a luta das classes.

 

Napoleão é um dos modernos aventureiros que melhor desempenhou o seu papel. Conhecendo a influência do seu nome nas massas populares, disfarçou-se em reformador, e em nome dos sofrimentos populares atacou o governo burguês de Luiz Filippe. Quando a burguesia, aterrada pela terrível insurreição proletária de junho de 18i8, implorava um salvador, apresentou-se como o campeão da ordem, da família, da religião, da propriedade. Uma vez presidente, continuou a obra de Cavaignac e dos republicanos burgueses; assassinou e deportou os socialistas. Todo o seu reinado foi uma longa tática: para refrear as aspirações liberais da burguesia, ameaçava-a com o proletariado: esmagava este com o exército para se proclamar depois o protetor da burguesia. Em todas as grandes greves do império aparece a mão dos altos funcionários. A greve da Creuzot foi em parte obra de Rouher. Logo na origem da Internacional, Bonaparte, compreendendo o alcance futuro desta associação, quiz apoderar-se da sua direção. Rouher fez muitas tentativas com esse fim.

 

É isto o que os homens da ordem chamam Socialismo Cesariano. Digam-nos, pois, que fizeram pelo povo os Cesares de Roma, e os Bonapartes de França? O papel que representou Bonaparte já fora representado pelos reis feudais. Estes protegiam e animavam o movimento das comunas; muitas vezes excitavam até a luta à mão armada entre os senhores e os munícipes, e aproveitavam-na para alargar a sua supremacia.

 

Em Inglaterra a luta das classes assume uma forma diferente. Ha ali três classes poderosamente constituídas: a aristocracia, proprietária do solo; a burguesia, tendo nas mãos a indústria e o comércio; e o proletariado fortemente organizado nos sindicatos. A burguesia e a aristocracia, como classes proprietárias estão sempre unidas para combaterem as aspirações emancipadoras do proletariado; como classes distintas, com interesses diversos, estão em perpetua luta, e chamam alternativamente em seu auxilio a classe proletária.

 

A aristocracia, possuidora das terras, tinha o monopólio do comércio dos trigos, protegido por impostos exorbitantes sobre a importação. A burguesia pelo contrário, era livre cambista; para dar saída aos seus produtos precisava sempre de novos mercados; para os vender sem rivalidade carecia de reduzir ao mínimo as despesas de produção, por conseguinte abaixar o preço da mão d’obra; para abaixar o salário é necessário diminuir o preço dos objetos necessários à vida do operário; é indispensável dar-lhe o pão barato.

 

Tornava-se, pois, urgente tirar a aristocracia o monopólio do comércio de trigos. O ex-ministro Bright, um dos mais ardentes campeões d’esta luta econômica, que teve também fases ensanguentadas, foi tão violento que poderia ser tomado por um agitador proletário. Amotinou o povo contra a nobreza. Foi então que a câmara dos lordes apresentou o Lei que reduzia a dez horas o trabalho nas fabricas. Era terrível o golpe: os Bright, os Cobden, que se proclamavam amigos do povo, levantaram se na câmara dos Commons para combater a lei das dez horas que, diziam eles, ia arruinar a indústria inglesa.

 

Disraeli, o chefe atual do partido aristocrático, escreveu socialismo na sua mocidade. O seu romance, As duas raças, é uma pintura das lutas do proletariado e da burguesia, que verte sangue. Foi ele que ainda ultimamente quiz estabelecer uma aliança entre o proletário e a nobreza.

 

A história dos Estados Unidos da América oferece exemplos semelhantes. O último vice presidente Wade fez uma profissão de fé comunista. O general Butler, Tadeus, Stevens e outros membros eminentes do partido republicano, impeliram o povo na senda revolucionaria com a ideia de lhe servir de arma contra os obstáculos que se opusessem a sua política.

 

Para ter o que os tartufos da burguesia chamam Socialismo Cesariano, não é preciso um Cesar. É uma das fatalidades da luta de classes.

 

Quando a luta se torna por tal forma intensa, que a burguesia sente em perigo os seus privilégios, recorre a um salvador; consente que o galope do cavalo de um soldado lhe salpique de lama as faces, com a condição que esse soldado sangre com a sua espada o proletariado; quando o ditador não cumpre a sua missão de carrasco, a burguesia acusa o proletariado de amar o despotismo, havendo sido ela que reclamou um braço forte para proteger os seus privilégios. Tal é a história.

 

por Paul Lafargue

 

O Pensamento Social, n.º 10, 30 de abril de 1872, p.1

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