"Cada fábrica deverá ser produtora da Consciência de Classe do trabalhador"
O capitalismo, aqui, quer queira quer não. vai ter que encostar o pescoço ao tronco e nós cortá-lo-emos com o machado. Vocês dizem que isto não é verdade, porque o capitalismo é muito forte.
Quando o colonialismo português penetrou em Moçambique era fraco. E quando era fraco, venceu-nos. Foi preciso esperarmos pelo seu desenvolvimento, foi preciso chegar ao capitalismo mais sofisticado e aí, então, obrigamo-lo a encostar o pescoço ao tronco para o cortarmos.
Também o capitalismo vai acabar em Moçambique. Vocês estão hoje a celebrar o Primeiro de Maio, como foi bem dito aqui, diferentemente dos anos de 1950 e dos anos de 1960.
Desde 1975, 25 de junho de 1975, vocês ficaram homens livres. E não só ficaram homens livres, como fizeram também da nossa Pátria uma zona libertada da humanidade, base da retaguarda para o avanço da Revolução na África Austral.
Smith estava sólido, há anos atrás. Agora admitiu alguns pretos no seu governo, para pintar alguns brancos lá dentro. Já aceita sentar-se à mesa com alguns pretos. Esses não são ministros, são ministros pretos. Os ministros são brancos na Ròdesia (“ministers and black ministers”).
Foi a luta que obrigou Smith a ampliar o seu governo. Não houve nenhum “acordo interno” no Zimbábue, mas sim, Smith apenas ampliou, aumentou, admitiu pretos no seu governo, para travar a luta. Mas o povo não se deixa enganar.
Hoje marchamos aqui. É difícil avaliar o valor do Primeiro de Maio e porquê? Viveram muitos anos dominados pelo colonialismo. Oprimidos. Inteligência retirada. Iniciativa criadora asfixiada.
Dependíamos do colonialismo. Havia certas alturas em que pensávamos que só vivíamos porque existia o colonialismo e sem o colonialismo não podíamos viver. Por isso alguns quando partiram os colonialistas, foram pela mesma estrada. O Mouzinho jã não estava aqui, não é? A apontar para o mar.
É difícil de avaliar o valor do Primeiro de Maio, porque estamos rodeados pelo regime hediondo e o mais desumano que existe e que é o da África do Sul. E pelo da Rodésia também, em segundo lugar.
Muitos países socialistas estão engajados nesta festa. Os corações dos soviéticos, dos cubanos, dos chineses, dos coreanos, batem ao mesmo ritmo que os nossos corações. Tão longe que eles estão - a URSS, Cuba, Coreia, Romênia... China - e os corações desses trabalhadores batem ao mesmo ritmo que o nosso ritmo acelerado.
Por isso, nesta manifestação não estamos sozinhos. Estamos com eles. Com todos os trabalhadores dos países socialistas.
Mas agora trata-se disso: filas para comprar comida, filas para apanhar os transportes para o serviço, filas no hospital, filas para a escola (porque não há lugar nas escolas), filas para comprar mandioca, batata-doce, farinha, feijão. Fila para o peixe, mesmo magumba, fila para comprar tudo.
Aí surgem os vossos patrões, os reacionários: "Porque formam filas? É porque são amigos dos comunistas; os comunistas não sabem tratar dos doentes". Há uma campanha contra os médicos dos países socialistas. "Os comunistas não sabem produzir machimbombos". "Os médicos dos países comunistas não conhecem as doenças tropicais". "Estas fábricas não vão funcionar, porque os comunistas não sabem produzir máquinas". Portanto, a vossa miséria (para esses reacionários) em Moçambique será eterna. Só o capitalismo é que o organiza a vida do povo...
Na União Soviética existem mais de duzentos milhões de habitantes (duzentos e oitenta milhões), todos vestidos. Todos comem, todos têm calçado, todos tem moradia, todos têm emprego. Nos países capitalistas, de quatrocentos a quinhentos milhões estão desempregados. Na República Popular da China, oitocentos milhões andam todos vestidos, comem, andam na universidade. estudam, trabalham, têm moradia e exportam ainda para nós. Cuba ainda não tem vinte anos de revolução... Oito vezes menor que Moçambique, com oito ou nove milhões de habitantes. A sua extensão. em superfície, é como Cabo Delgado. Todos estudam, trabalham e ainda mandam especialistas para nos apoiarem em todos os domínios. Não há desemprego.
Podia dar muitos exemplos, como os da Bulgária, República Democrática Alemã, Romênia, Iugoslávia, etc. Por isso, temos esta certeza: o capitalismo vai capitular, quer queira quer não. Vamos encostar o seu pescoço ao tronco e com o machado dar-lhe o golpe de misericórdia. Mas para isso é preciso que façamos dos nossos braços, instrumentos da nossa inteligência. Que façamos dos nossos braços, instrumentos da nossa vontade, do nosso desejo, agentes dinamizadores da nossa capacidade realizadora, da nossa iniciativa criadora.
É preciso colocar os nossos dez dedos — cinco de cada mão — em volta dó machado, da enxada, da charrua, do trator, da viatura, do comboio, da máquina, nas fábricas. Assim liquidaremos a miséria no nosso país.
Quando aqui vêm os nossos amigos dos países socialistas, não é para chefiar. Andam por aí alguns reacionários a dizer: “Estes engenheiros estão aqui para vos tirar os empregos”. Os técnicos dos países socialistas são serventes? Como vocês no tempo do colonialismo? Vocês não eram serventes? Criados e serventes?
Visitei algumas fábricas onde temos cooperantes. Eu não os chamarei de cooperantes. Os trabalhadores dos países socialistas não são cooperantes. São internacionalistas. São nossos aliados. Eles formaram quadros competentes que dirigem máquinas, que já sabem planificar, programar, definir objetivos, metas e como realizá-las. Já vi esses quadros formados. Por isso quando os nossos amigos vêm para aqui, é uma forma de solidariedade na luta, nesta luta dos trabalhadores de todo o mundo. Vêm transmitir a técnica, a ciência, a tecnologia, a transformação do nosso pensamento rotineiro em pensamento dinâmico. É isto o que vêm fazer os nossos amigos dos países socialistas. Vêm transmitir as suas experiências, porque já construíram os seus países, fazendo deles países desenvolvidos. Hoje, lá, não há fome. Exportam comida para os países capitalistas de que vocês são amigos.
Para nós, a primeira tarefa é liquidar a fome, a nudez e a miséria. Isto é uma definição da nossa aliança operário-camponesa. Esta definição não é abstrata, temos essa convicção e levamos essa certeza no olhar. Era essa certeza que nos conduzia durante a luta de libertação nacional. Continuamos com ela de uma maneira mais forte porque temos a base, temos o poder político, temos o instrumento que são os homens, é o Povo.
Ao festejar este dia no ano da Estruturação do Partido, estruturação da nossa vida, estruturação das nossas mentalidades, transformação do nosso pensamento, consolidação da nossa aliança com os países socialistas, com as forças progressistas dos países capitalistas é preciso definir cada vez mais as nossas tarefas.
O capitalismo não é nosso amigo. Podemos cooperar, mas não é amigo. Cooperamos porque necessitamos dele e ele necessita de nós. E nos países capitalistas temos o apoio das forças democráticas e progressistas.
São estas as razões por que viemos encher esta praça com muitas bandeiras ganhas e criadas através de realizações. Bandeiras de produção, da OMM, da juventude e dos continuadores. Continuadores de quê? Da miséria? Analfabetismo? Obscurantismo? Superstição? Indisciplina nas escolas, nas fábricas? Esbanjamento? Desperdício?
Em 1979 não seremos o que somos hoje. Façamos dos nossos braços instrumentos da nossa energia, do nosso esforço, da nossa inteligência. Façamos dos nossos braços instrumentos da manifestação de disciplina, quer dizer, da organização do nosso pensamento.
Bebedeira... embriaguez… dormir em cima das máquinas… vamos combater tudo isso energicamente para sermos trabalhadores dignos, nascidos do Primeiro de Maio. Cada fábrica deverá ser mais organizada, mais disciplinada, mais realizadora das tarefas definidas, quer dizer, as fábricas devem ser produtoras da consciência de classe do trabalhador em Moçambique.
Discurso do Presidente Samora Machel na festa do Primeiro de Maio de 1978 em Moçambique