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REIMPRESSÕES

Foto do escritorNOVACULTURA.info

Por que acontecem as crises? Por que existe o desemprego?


Desemprego e crise são palavras que descrevem bem a situação econômica e política brasileira dos últimos anos. Atualmente, nosso país já possui 26 milhões de desempregados e semi-desempregados que perambulam por todos os cantos das cidades em busca de trabalho, passando horas ou até mesmo dias nas filas para de emprego para disputar mesmo os mais insalubres e precários trabalhos. Mesmo os piores trabalhos são ainda escassos [1], como comprovam as filas de mais de 30 horas de espera para empregos em lojas de shopping centers. O pauperismo se alastra pelos bairros, favelas, pelas regiões rurais; eclode a mendicância; a fome golpeia os lares dos trabalhadores; o desemprego acaba por empurrar para a insegurança e para os piores trabalhos as crianças e jovens das famílias proletárias, que tomam rumo aos montes aos semáforos, ônibus e metrôs para tentar colocar algum dinheiro que seja na mesa da família no final do dia. Mesmo aqueles empregados há décadas na mesma empresa ou no governo, prestes a se aposentar, com bons salários e que imaginavam nunca mais ter de passar por quaisquer dificuldades, veem-se agora no pântano do desemprego e da miséria, a exemplo dos funcionários públicos, dos professores universitários das faculdades públicas. No fim, todo o país parece tomado pela anarquia, pelo pessimismo e pela falta de perspectiva no amanhã.

Como se chegou a tal situação? O que explica a eclosão das crises econômicas sob o capitalismo? São elas parte constitutiva do sistema capitalista ou fenômenos que ocorrem devido puramente à má administração e à corrupção dos funcionários do Estado, do egoísmo dos empresários ou demais motivos culturais ou individuais? São as máquinas que geram o desemprego? Por que existe o desemprego?

A verdade é que a crise é uma situação cíclica (ou seja, ocorre periodicamente, em intervalos mais ou menos longos de tempo) que afeta todos os países do mundo capitalista sem exceção. A causa básica da eclosão das crises sob o capitalismo reside na própria natureza desse sistema, nas suas características intrínsecas, na contradição entre o caráter cada vez mais social da produção (isto é, para que a produção capitalista aconteça, deve mobilizar um contingente cada vez maior de trabalhadores assalariados que trabalham para os capitalistas) e a apropriação privada, dos capitalistas, sobre os resultados da produção. Por que a contradição entre o caráter social da produção sob o capitalismo e a apropriação privada de seus resultados é o fator que gera a eclosão das crises econômicas, pois?

É de suma importância compreendermos os pormenores sobre como as crises eclodem. As crises são a expressão mais escancarada do esgotamento histórico do sistema capitalista, de seu caráter parasitário, putrefato e reacionário, e determinam a necessidade de substituição da sociedade capitalista pela sociedade socialista por meio da revolução proletária. Sendo assim, todos os comunistas devem saber explicar às massas como elas ocorrem e por que ocorrem.

Não é intenção nossa analisar aqui os pormenores específicos da crise econômica no Brasil. Nosso país possui uma série de peculiaridades, como o atraso econômico, a dependência semicolonial em relação ao imperialismo, a persistência acentuada de formas de exploração pré-capitalistas, feudais, coercitivas, semicoercitivas, etc., que certamente dificultariam a análise, o que não nos impede, todavia, de abordarmos a situação brasileira como forma de elucidar melhor a compreensão de como eclodem as crises capitalistas e por que razão existe o desemprego.

Como se encontra a situação das massas trabalhadoras sob o pré-capitalismo e o capitalismo?

A diferença radical entre a situação das massas trabalhadoras da sociedade capitalista e das sociedades pré-capitalistas (isto é, na comunidade primitiva, na escravidão, no feudalismo) reside no fato fundamental de, sob o capitalismo, as massas trabalhadoras estarem separadas dos meios de produção e serem trabalhadoras assalariadas.

O que significa isso? No período do feudalismo, por exemplo, os trabalhadores eram camponeses ou artesãos. Os camponeses eram trabalhadores que possuíam alguns pedaços de terras onde podiam plantar seu próprio alimento, pescavam nos rios, podiam extrair lenha dos bosques comunais para cozinhar, e em muitos casos possuíam nos quintais de casa pequenas oficinas onde fabricavam, por exemplo, suas próprias roupas, carroças, instrumentos de trabalho, etc. Os artesãos, por conseguinte, eram donos das próprias oficinas em que produziam artigos industriais que vendiam no comércio. Ou seja, tanto o camponês quanto o artesão eram uma classe de pequenos proprietários, não precisavam tornar-se trabalhadores assalariados pois aplicavam sua força de trabalho – isto é, todo o conjunto de capacidades físicas, espirituais e intelectuais do homem para o trabalho –, na própria economia, e viviam apenas dela. Constituíam um tipo de trabalhador que estava atado aos meios de produção, em que este mesmo possui seus meios de produção (seja uma terra, uma oficina, uma quantidade de gado, etc.) para produzir, por suas próprias mãos, os bens de que precisa para viver. Um escravo, por exemplo, estava atado aos meios de produção ao ponto de ser ele mesmo um meio de produção; era vendido de uma vez por todas ao seu senhor, tal como o boi é vendido ao lavrador.

Tal situação muda radicalmente no período do capitalismo. Os trabalhadores sob o capitalismo (ao contrário do camponês, do artesão, do escravo) estão agora separados dos meios de produção. Ou seja, não possuem uma terra, uma oficina, um pequeno negócio etc. do qual possam viver, produzir seus alimentos, os bens que necessitam. Tais bens agora os trabalhadores somente poderão conseguir trocando-os por dinheiro no mercado, dinheiro este que somente conseguirão caso estejam empregados como operários assalariados na empresa de um capitalista. O trabalhador sob o capitalismo, agora, não possui qualquer propriedade sobre os meios de produção – a única coisa da qual realmente é proprietário é de sua força de trabalho, a qual deve vender a um capitalista em troca de um salário, para que possa no fim do mês ter um salário para comprar os bens do qual necessita para viver.

A contradição de classe básica sob o capitalismo e o desemprego

Cada vez mais, à medida que se desenvolve o capitalismo, a sociedade se divide em duas grandes classes: a burguesia e o proletariado. O proletariado é a classe que deve trabalhar em troca de salário, ou seja, é a classe que vende sua força de trabalho. A burguesia, por sua vez, é a classe que compra a força de trabalho do proletariado, para que este possa produzir numa empresa capitalista e lhe gerar mais dinheiro.

Há aqui dois fins distintos que muito têm a dizer sobre o desemprego: uma parte da sociedade, o proletariado, vende sua força de trabalho, mas por que o faz? Para viver, para comprar no mercado os bens que necessita. E por qual motivo a burguesia compra a força de trabalho? Compra-a não apenas para que possa viver, mas para que possa enriquecer, para que possa, ao final de seu investimento, sair com uma quantidade de capital maior que a que investiu em sua empresa. É exatamente esta razão – expandir a produção, aumentar sua empresa e aumentar seus lucros – que estimula os capitalistas a investir quantidades maiores de capitais em suas empresas e, portanto, contratar mais operários assalariados. Caso os capitalistas, porventura, não estejam em condições de enriquecer ao aplicar capitais maiores em suas empresas, não aplicarão mais capitais e, portanto, não contratarão novos trabalhadores assalariados. Caso ocorra de os capitalistas não conseguirem vender as mercadorias produzidas em suas empresas no mercado, por exemplo, pela falta de pessoas que as comprem, terá que reduzir a produção de sua empresa e, portanto, demitir os trabalhadores assalariados em sua empresa.

O que podemos concluir a partir disso? O operário, para viver, deve vender sua força de trabalho, mas para vendê-la, deve encontrar algum capitalista que a compre, e caso os capitalistas porventura não se interessem em comprar sua força de trabalho pois não têm condições de enriquecer fazendo-o, o operário não terá condições de vender sua força de trabalho – estará desempregado – e, portanto, não poderá sequer viver, não poderá ter acesso aos bens que necessita para viver pois não terá dinheiro para comprá-los. Constatando esta característica estrutural do capitalismo já no ano de 1848, Marx e Engels já sublinham em razão disso ser o capitalismo um sistema em que “o operário só vive para multiplicar o capital, só vive na medida em que o exige o interesse da classe dominante”. [2] O proletariado vive, então, sob a completa dependência não de um ou outro capitalista, mas de toda a classe capitalista; tem seu destino “completamente atrelado à carruagem do capital”, que se manifesta por meio do desemprego, ou das ameaças de desemprego.

A partir deste raciocínio, também podemos imaginar o quão falsas são as teorias dos intelectuais burgueses acerca do desemprego sob o capitalismo. Segundo tais teorias – a mais absurda delas, o “desemprego voluntário” –, o desemprego teria sua origem não na própria estrutura de funcionamento do capitalismo, mas sim na suposta “preguiça” dos desempregados, ou da falta de obstinação destes em buscar um emprego. Ainda que adotemos a falsíssima premissa dessa teoria absurda e reacionária, mesmo que os desempregados o fossem por não “quererem” trabalhar ou por não se esforçarem o suficiente para arranjar um trabalho, pouco importaria: a existência de trabalho disponível para a população proletária é dependente da capacidade de os capitalistas conseguirem ou não vender suas mercadorias, se possuem mercados suficientemente lucrativos, se as condições para o investimento de capital numa empresa – para então contratar operários assalariados – são favoráveis, etc.

Dado que o sistema capitalista de produção avança mediante ciclos que oscilam entre prosperidade e crise, parte expressiva dos capitalistas (principalmente os pequenos e médios capitalistas) encontram-se sempre na incerteza da existência ou não de mercados, estão sempre beirando a falência e, portanto, ou não desejam contratar mais operários ou demitem os que estão trabalhando. A própria natureza do sistema capitalista impede a liquidação do desemprego: durante períodos de crise, é favorável para os capitalistas manter uma parcela expressiva da classe operária nas condições de desemprego. Dado que há uma massa imensa de operários desempregados buscando desesperadamente vender sua força de trabalho para que possam colocar o mínimo na mesa de casa, e pouquíssimos capitalistas querendo comprar a força de trabalho (uma enorme oferta de força de trabalho sobre uma procura pequeníssima por força de trabalho), estes se aproveitam da miséria e do desespero dos operários para trabalhar para, diante da menor miragem de saída de um período de crise econômica, contratar uma parte dos operários pelos piores salários possíveis, aumentando assim seus lucros. [3] Eis aqui também uma amostra da tendência dos capitalistas de buscarem manter desempregada uma parcela da classe operária para que, em períodos de reanimação econômica, tenham à sua disposição um enorme afluxo de trabalhadores assalariados mal remunerados.

Concluindo, podemos agora perceber que o desemprego é uma característica específica do sistema capitalista de produção, e só pode existir sob esse sistema, nas condições em que a massa trabalhadora encontra-se separada dos meios de produção, nas condições em que a força de trabalho é uma mercadoria que pode ser vendida e comprada. Um escravo não vende sua força de trabalho ao senhor, ao contrário, ele mesmo é vendido a esse, como se um objeto fosse. Um camponês também não vende sua força de trabalho ao latifundiário, é apenas um “inquilino” deste, que cultiva a terra em troca de pagar um “aluguel” ao latifundiário. Se porventura ocorrer uma seca, uma inundação, ou uma praga se apoderar das lavouras ou pastos, levando a más colheitas ou à perda do gado, um senhor não pode “demitir” seu escravo, tampouco um latifundiário pode “demitir” um camponês seu, dado que a “contratação” ("contratação" nada mais é que a compra da força de trabalho) ou “demissão” só são possíveis quando a força de trabalho se torna uma mercadoria, isto é, quando pode ser vendida e comprada.

É evidente que a miséria, a pobreza, as comoções e calamidades já existiam nos períodos pré-capitalistas. Todavia, apenas nas condições do capitalismo a miséria e a pobreza aparecem como causa direta do desemprego, como causa direta do fato de os proletários, donos da força de trabalho, não terem para quem vendê-las, por não haver capitalistas que queiram comprar a força de trabalho dos proletários.

Desenvolvimento do capitalismo, desemprego e crise

Ao contrário dos períodos pré-capitalistas, quando as massas trabalhadoras estavam atadas aos meios de produção – possuíam uma terra, uma oficina, certa quantidade de gado, e assim por diante –, sob o capitalismo os trabalhadores não possuem meios de produção e devem se tornar operários assalariados para os novos donos dos meios de produção, os capitalistas. Com o desenvolvimento do capitalismo, cada vez mais as grandes indústrias, as minas, ferrovias, depósitos e galpões, meios de transporte, as terras e a produção agrícola, passam para as mãos dos capitalistas. As velhas oficinas dos artesãos não suportam a concorrência das mercadorias produzidas nas indústrias dos capitalistas e se arruínam, os artesãos perdem seus meios de produção e se tornam proletários, precisam agora vender sua força de trabalho, tornando-se trabalhadores assalariados na empresa de um capitalista. A produção agrícola dos camponeses e latifundiários, produzida por regra sob uma técnica atrasada e rudimentar, não suporta a concorrência das granjas capitalistas que empregam o trabalho assalariado em larga escala e uma técnica superior, e se arruínam. Os camponeses perdem suas terras para as granjas capitalistas, para os bancos, etc., e tomam rumo às cidades, onde deverão também vender sua força de trabalho aos capitalistas, tornando-se proletários. Os latifundiários, sob pena de ruína, devem por sua vez se tornar capitalistas.

O desenvolvimento do capitalismo, pois, significa o desenvolvimento das relações de produção capitalistas, ou seja, da contradição e do antagonismo entre a burguesia, proprietária dos modernos meios de produção capitalistas, e os proletários, que nada mais têm que sua força de trabalho. Os camponeses e artesãos se arruínam e tornam-se proletários [4], os latifundiários por sua vez, para evitarem a ruína inevitável, vendem suas terras e se tornam capitalistas.

O desenvolvimento das relações de produção capitalistas são atreladas e dependentes, em última instância, do desenvolvimento das forças produtivas capitalistas. O que significa isso? Os capitalistas, para aumentarem a mais-valia da qual se apropriam, precisam aumentar o capital aplicado nas suas empresas, comprar mais máquinas, mais baratas e produtivas, abrir novas fábricas, e contratar não apenas mais operários, como também operários de diferentes tipos de qualificação que saibam operar as novas máquinas, executar as novas e mais produtivas operações, etc. Por sua vez, a demanda destes capitalistas em adquirir novas máquinas, edificar novas fábricas, e assim por diante, faz com que apareçam também novos capitalistas especializados, por exemplo, na produção de máquinas, que para produzirem estas máquinas precisarão comprar aço, vidro, edificar novas fábricas, que por sua vez levará os capitalistas que investem na produção de aço e vidro aumentarem a produção, que por sua vez fará os capitalistas que investem na extração de minério de ferro e areia aumentarem a produção, etc. A necessidade de os capitalistas venderem suas respectivas mercadorias para consumidores dos mais variados locais estimulará a necessidade de construção de novas ferrovias, estradas, estimulará a construção de novos portos, navios, que por sua vez consumirão mais combustível, carvão, petróleo, e assim por diante. Todo este movimento tem como consequência que os capitalistas precisarão aumentar ainda mais a compra da força de trabalho (isto é, contratar mais e mais trabalhadores), levando a um aumento exponencial do contingente da classe operária. Eis aí o que significa o desenvolvimento das forças produtivas capitalistas: por um lado, novas e novas fábricas, empresas, estradas, ferrovias, galpões, meios de transporte, máquinas mais baratas e mais produtivas, etc., etc. - enfim, tudo aquilo que é necessário para viabilizar a produção das mercadorias e a circulação das mesmas pelos mercados - são construídas e/ou produzidas. Por outro, há um aumento do contingente numérico da classe operária, assim como o surgimento constante de novos e novos tipos de operários, com os diferentes tipos de especialização exigidos pelas novíssimas máquinas e invenções técnicas a todo tempo nas empresas. [5]

O desenvolvimento do capitalismo (isto é, o desenvolvimento das forças produtivas capitalistas e das relações de produção capitalistas) tem como consequência e se traduz no aumento do mercado consumidor. Por um lado, o aumento do contingente numérico da classe operária faz com que uma parcela cada vez maior das massas trabalhadoras - que antes, como camponeses ou artesãos, produziam pela própria mão todos os bens que necessitavam para sobreviver - disponha de um salário e, ao mesmo tempo, precise comprar no mercado os bens que precise para sobreviver, pois não dispõe atualmente dos meios de produção para produzi-los pela própria mão. Com o aumento do contingente numérico da população que precisa comprar seus bens de consumo [6], os capitalistas que investem seu capital na produção de bens de consumo (que são vendidos diretamente à população) aumentam seus investimentos para aumentarem seus lucros, e para isso compram mais máquinas, erguem novas fábricas. Assim, os capitalistas que investem o capital, por exemplo, na produção de aço, na construção civil, etc., para também aumentarem seus lucros, aumentam os investimentos de capital e passam a comprar também mais minério de ferro, aço, vidro, tijolos, cimento, novas e novas máquinas, etc. O aumento do mercado interno se traduz também, pois, na maior demanda dos diferentes capitalistas por meios de produção. O aumento do mercado interno leva à crescente interdependência entre os diferentes capitalistas por meio do comércio, onde uns fornecem meios de produção para outros.

Há uma pergunta que já foi por nós respondida, mas precisamos voltar nela para prosseguir. Por qual motivo os capitalistas aplicam seu capital em determinado setor da produção material, do comércio, etc.? Logicamente, para aumentar seus lucros e enriquecer. Os capitalistas sempre buscam reduzir o custo de produção (o custo de produção sob o capitalismo se divide na parte do capital que os capitalistas empregam na compra de meios de produção, isto é, o capital constante, e na compra da força de trabalho dos operários, isto é, o capital variável) e aumentar o lucro (o preço de uma mercadoria produzida numa empresa capitalista se divide em custo de produção e lucro), sempre buscam reduzir cada vez mais os preços de suas mercadorias, produzir mercadorias mais baratas e arruinar os outros capitalistas contra quem concorrem pela conquista do mercado consumidor.

Para reduzirem os custos de produção, aumentar seus lucros e baratear as mercadorias, os capitalistas compelem os operários de suas empresas a produzir em ritmos cada vez mais intensos, compram máquinas mais baratas e produtivas, etc.

Um operário que, por exemplo, recebe um salário de 2000 reais para produzir 4000 unidades de mercadorias, recebe 1 real para cada 2 unidades que produz. Com a intensificação dos ritmos de trabalho, com a introdução de novas máquinas, o mesmo operário segue recebendo um salário de 2000 para produzir agora 8000, ou seja, recebe agora 50 centavos para produzir as mesmas duas unidades. Seu salário foi na realidade reduzido pela metade, pois agora deve trabalhar o dobro para ganhar o mesmo salário bruto. Suponhamos, porém, que o capitalista (partindo da premissa que este operário que, para operar uma máquina mais nova e mais produtiva, teve de obter uma nova qualificação) resolva aumentar o salário do operário de 2000 para 3000, pelo fato de haver este obtido uma nova qualificação. Ainda que este aumento salarial do operário tenha ocorrido, seu salário na realidade ainda assim diminuiu pois, recebendo 3000 reais para produzir 8000 unidades, seu salário é de agora 75 centavos para cada 2 unidades que produz. Seu salário reduziu-se em 25% em relação ao 1 real para 2 unidades que recebia anteriormente. Essa é uma das mais significativas leis do sistema capitalista de produção, no qual os salários dos operários diminuem em relação ao aumento da produção.

O operário desta empresa, no lugar de produzir 4000 unidades, produz agora 8000 unidades. Este único operário, sozinho, realiza agora o trabalho de dois operários. A intensificação dos ritmos de trabalho já gera seus tenebrosos efeitos no "mercado de trabalho". Por quê? A nova geração de jovens operários, que bate atualmente nas portas da empresa deixando seus currículos em busca de emprego, recebe um enfático "não" dos patrões, pois estes puderam dobrar a produção da empresa simplesmente obrigando seus trabalhadores a trabalhar o dobro. Esta jovem geração de operários que bateu às portas desta empresa constituirá um pequeno contingente de desempregados, pois são completamente desnecessários para o aumento da produção capitalista, que pode se dar simplesmente através da intensificação da exploração dos operários já desempregados. Imaginemos então que a intensificação do trabalho dos operários empregados não aconteça apenas nesta empresa utilizada como exemplo, mas em todas as empresas capitalistas de um determinado país. Esta jovem geração de operários desempregados não será apenas um pequeno punhado, mas um contingente de centenas de milhares ou mesmo milhões de desempregados, se se leva em conta a escala de um país inteiro. Imaginemos também que aquele operário, que com a intensificação do trabalho passou a trabalhar por dois, não trabalhe apenas por dois, mas por três, quatro ou cinco, e que tal escala também se dê a nível de um país inteiro. O contingente de desempregado triplica, quadruplica, quintuplica.

Os capitalistas até então permaneciam numa disputa encarniçada entre si, cada qual capitalista em sua própria empresa, assediando seus próprios operários a trabalhar mais e mais, para produzir cada vez mais mercadorias, cada vez mais baratas, para conquistar o mercado e arruinar o capitalista concorrente. Subitamente, os capitalistas começam a observar que algo não está certo. Por um lado, a intensificação da exploração dos operários empregados nas empresas faz com que os salários diminuam e não consigam acompanhar o ritmo enorme do aumento da produção. Por outro, as novas gerações de trabalhadores permanecem desempregadas, pois ou não conseguem, ou possuem enormes dificuldades para se incorporarem às empresas capitalistas, dificuldades essas que surgem como resultado direto da intensificação do trabalho nas empresas, pelo fato de o capitalista não necessitar passar à contratação de novos operários devido que os já empregados trabalham em ritmos excessivos, com cada qual operário fazendo o trabalho de dois, três, quatro operários.

O que ocorre de errado? Todos os capitalistas começam a reparar que as mercadorias que foram produzidas em suas empresas, ainda que de fato estejam mais baratas, permanecem atoladas, mofando nos depósitos e armazéns. Os supermercados, mercearias, comércios, ainda que atolados de diferentes bens de consumo, alimentos, etc., subitamente perdem quase toda a clientela, não há para quem vender os produtos. Há um "excesso" de mercadorias, que não conseguem ser vendidas. Mas por qual motivo ocorre tal situação de falta de pessoas que comprem estas mercadorias "excedentes"? Ocorreria que tais pessoas, de repente, não necessitassem mais destes bens? Não, não ocorre. Tal situação se dá pois os capitalistas, para enriquecerem e se apropriarem dos enormes lucros, devem vender suas mercadorias. Mas quem são os principais consumidores das mercadorias produzidas nas empresas capitalistas? Os próprios operários. Se os salários dos operários empregados diminuem bruscamente com a intensificação dos ritmos de trabalho e não conseguem de forma nenhuma acompanhar o enorme ascenso da produção, e uma parte expressiva dos operários se encontra na condição de desempregados, a massa salarial existente na sociedade é em absoluto insuficiente para adquirir a enorme massa de bens produzida nas empresas capitalistas. Suponhamos, por exemplo, que todas as empresas capitalistas lograram produzir 150 unidades, mas em razão da pobreza, do desemprego, dos baixos salários, etc., a população só tenha capacidade para consumir 100 unidades. Haverá um "excesso" de 50 unidades que não conseguem ser vendidas em lugar algum.

Eis aí o verdadeiro caráter das crises econômicas sob o capitalismo. As crises econômicas sob o capitalismo são crises de superprodução. Mas o que seria a "superprodução" sob as condições do capitalismo? Seria uma produção gigantesca, pujante? Não necessariamente. A superprodução sob o capitalismo ocorre porque se produz muito não em relação às necessidades das massas, mas sim em relação à capacidade de compra das mesmas. É possível que determinada produção capitalista, por exemplo, se dê num nível medíocre e completamente insuficiente para a satisfação das massas, mas que em razão da pobreza destas, do fato de as massas não constituírem uma massa salarial suficiente para comprar até mesmo os bens produzidos por esta medíocre produção, esta seja uma superprodução capitalista. É por tal motivo que o marxismo desvenda corretamente que as crises sob o capitalismo sejam crises de superprodução relativa, isto é, relativas não às necessidades das massas, mas à capacidade de consumo das mesmas, relativas pois às necessidades do capital. O marxismo desvenda também que, à medida que o capitalismo se desenvolve, forma-se uma superpopulação relativa [7], isto é, a imensa massa de desempregados. Observamos como já nos períodos de prosperidade do capitalismo, quando a produção está em plena ascensão, essa massa de desempregados passa a se formar gradualmente, e aumenta vertiginosamente em períodos de crise. Mas por que o marxismo compreende a massa de desempregados como uma "superpopulação"? Os desempregados no capitalismo não formam de forma alguma uma "superpopulação" em termos absolutos, mas apenas em termos relativos, relativos em relação às necessidades do capital. Não precisando desta determinada quantidade de operários em períodos de prosperidade por já explorar em demasia os operários empregados, e também precisando reduzir o número de operários empregados em períodos de queda da produção, forma-se e se acentua a massa da superpopulação relativa, submetida à chaga do desemprego, da miséria e da fome.

Sigamos em frente. Com o aumento da pobreza das massas, do desemprego, etc., a massa salarial se reduz e se forma um "excedente" de mercadorias que não conseguem ser vendidas. Os comerciantes, lojistas, etc., logo percebem a queda no número de clientes. Mesmo reduzindo em muito o preço das mercadorias, não conseguem vendê-las. Não tendo condições de expandir as vendas ou, como na maioria dos casos, caindo em enorme prejuízo por conta da queda absoluta nas vendas, logo demitem parte de seus empregados, assim como parte expressiva destes mesmos comerciantes se arruínam completamente, veem suas empresas falir e demitem todos seus empregados.

Os capitalistas industriais que investem seu capital na produção de bens de consumo, vendidos diretamente à população, logo sentem bruscamente as quedas nas vendas dos comerciantes. Devido às quedas nas vendas, os comerciantes rapidamente reduzem de forma drástica as encomendas aos capitalistas industriais, donos das fábrica em que se produzem bens de consumo. Os capitalistas donos das fábricas de bens de consumo, então, veem-se rapidamente com um brutal excesso de produção que não consegue ser vendida. Devido à enorme oferta sobre a pouca procura, os preços das mercadorias despencam, e despencam a tal nível que os industriais do ramo de bens de consumo vendem suas mercadorias com enorme prejuízo, sem lucro ou com um lucro insignificante. Destroem suas mercadorias e reduzem a produção com o fim de reduzir a oferta, levando ao aumento de preços das mercadorias de tal maneira que possa levar novamente a um aumento dos lucros e à reanimação da produção. A destruição das mercadorias e a redução da produção por parte dos capitalistas, na expectativa de reduzir a oferta para aumentar os preços e liquidar o "excesso" de mercadorias paradas, não tem como consequência senão a redução ainda maior dos preços, o aumento do "excesso" de mercadorias e a piora da crise, pois como, para reduzir a produção, os capitalistas devem demitir contingentes maciços de operários, o desemprego piora ainda mais, a massa salarial se retrai ainda mais e diminui ainda mais a demanda por bens de consumo.

O capitalista industrial do ramo de bens de consumo reduz drasticamente a produção, e assim demite enormes contingentes de trabalhadores. Reduzindo a produção, reduz também a compra de matérias-primas, máquinas, etc. Parte expressiva de sua fábrica encontra-se ociosa pela queda na produção. Reduz o consumo de combustíveis, energia elétrica, etc. Por sua vez, os capitalistas dos ramos de máquinas, extração de matérias-primas, de produção de eletricidade e demais também reduzem drasticamente a produção pela falta de compradores, e demitem também seus trabalhadores. Tal como ocorrera com os capitalistas industriais do ramo de bens de consumo, entre os capitalistas do ramo de meios de produção também prossegue o fenômeno de empresas que funcionam abaixo de sua capacidade.

O prosseguimento da crise na esfera dos bancos intensifica a crise na indústria e no comércio. Os bancos, que em períodos de prosperidade emprestaram enormes quantidades de capitais aos industriais e comerciantes para que estes pudessem expandir suas empresas, agora se veem numa situação em que estes mesmos industriais e comerciantes não lhes retornam os capitais emprestados, menos ainda lhes pagam os juros, por conta dos prejuízos que estão tendo em razão da crise. Por conta disto, os bancos deixam de fornecer empréstimos aos diferentes capitalistas - ou só o fazem sob condições bastante excepcionais -, estes não têm condições de manter a produção e o desemprego se agrava. Em períodos de prosperidade, da mesma forma, é comum que a população trabalhadora compre mercadorias a crédito, pagando as mercadorias de forma parcelada, mês a mês. Enormes contingentes da população trabalhadora que adquiriram mercadorias a crédito nos períodos de prosperidade, encontram-se agora, na crise, na condição de desempregados e empobrecidos, enfrentando mil e uma dificuldades para pagarem as prestações das mercadorias adquiridas. Atrasando os pagamentos das prestações, sobrecarregam-se ainda mais com o pagamento de todo tipo de multas, juros, etc. Milhões e milhões de pessoas se encontram com "nome sujo" na praça, fazendo com que os comerciantes lhes neguem a compra de mais mercadorias a crédito, dificultando ainda mais a saída do "excesso" de mercadorias.

Por fim, todos os ramos da produção capitalista desabam um após outro, como num efeito dominó. E qual a razão da crise? O "excesso" relativo de mercadorias, que ocorre por conta da pobreza das massas, pobreza esta que as próprias leis do sistema capitalista de produção engendram. Parece algo "incompreensível" que, sob o capitalismo, a causa da pobreza e da miséria do povo seja não a falta de bens, mas o excesso dos mesmos. Nos períodos de crise do sistema capitalista de produção, ainda que com um enorme excesso de alimentos, milhões de pessoas padecem pela fome. Ainda que haja excesso de combustíveis, gás, etc., milhões de pessoas padecem de frio. Mesmo que milhões passem fome, toneladas e toneladas de alimentos são jogados nos rios, incendiados nas fornalhas, pois o "excesso" de oferta de alimentos derruba os preços para os capitalistas agrários, fazendo com que estes tenham de se livrar do enorme excesso de oferta para que os preços aumentem e tenham ao menos um lucro medíocre. Com milhões passando frio e com um "excesso" de carvão, gás e combustíveis, os capitalistas também procedem em destruir a produção para reduzir a oferta e aumentar os preços, para que voltem a lucrar. Afinal, caso a lógica do capitalismo fosse satisfazer as crescentes necessidades materiais e espirituais das massas, não haveria motivo para se falar num "excesso" de produção, pelo contrário, tal excesso seria benéfico no sentido em que as massas teriam à sua disposição todo tipo de bens necessários para satisfazer suas necessidades materiais e espirituais. Porém, ainda que com o excesso de tais mercadorias disponíveis, as massas sentem falta mesmo dos mais essenciais bens para satisfazer suas necessidades, dado que não possuem dinheiro para comprar estes bens, padecem pela chaga do desemprego.

Quanto a isso, sublinha Marx corretamente que: "Cada crise destrói regularmente não só uma grande massa de produtos já fabricados, mas também uma grande parte das próprias forças produtivas já desenvolvidas. Uma epidemia, que em qualquer outra época teria parecido um paradoxo, desaba sobre a sociedade - a epidemia da superprodução. Subitamente, a sociedade se vê reconduzida a um estado de barbárie momentânea; dir-se-ia que a fome ou uma guerra de extermínios cortaram-lhe todos os meios de subsistência; a indústria e o comércio parecem aniquilados. E por quê? Porque a sociedade possui demasiada civilização, demasiados meios de subsistência, demasiada indústria, demasiado comércio. As forças produtivas de que dispõe não mais favorecem o desenvolvimento das relações de propriedade burguesa; pelo contrário, tornaram-se por demais poderosas para essas condições, que passam a entravá-las; e todas as vezes que as forças produtivas sociais se libertam desses entraves, precipitam na desordem a sociedade inteira e ameaçam a existência da propriedade burguesa. O sistema burguês tornou-se demasiado estreito para conter as riquezas criadas em seu seio. De que maneira a burguesia consegue vencer essas crises? De um lado, pela destruição violenta de grande quantidade de forças produtivas; de outro lado, pela conquista de novos mercados e pela exploração mais intensa dos antigos." [8]

As crises econômicas, por fim, têm sua base na contradição inerente ao capitalismo: a contradição entre o caráter cada vez mais social da produção, e a apropriação privada de seus resultados. Ainda que a produção só possa ser viabilizada mediante a mobilização de milhões e milhões de operários, a razão para a produção capitalista é o estreito âmbito do lucro privado. Não tendo mais possibilidade de vender suas mercadorias para lucrar em razão da pobreza das massas que eles próprios engendraram, os capitalistas demitem seus operários, reduzem a produção, e jogam toda a sociedade numa anarquia ainda mais profunda. [9]

Por fim, a forma capitalista de produção, voltada para o lucro privado e o enriquecimento dos capitalistas, mostra-se um entrave para o avanço das gigantescas forças produtivas criadas sob o próprio capitalismo. Destroem as forças produtivas, no lugar de desenvolvê-las.

Para se acabar com esse estado de coisas, é necessário colocar a forma de apropriação da produção em ressonância com seu caráter social. Tornar propriedade social as grandes forças produtivas sociais surgidas sob o capitalismo, arrancar dos capitalistas os modernos meios de produção e colocá-los sob a forma de propriedade de todo o povo. Arranca-se pela raiz a grande causa das crises e a produção passa a ter a motivação para seu crescimento ininterrupto, sem ser interrompido por crises: a crescente satisfação das necessidades materiais e culturais das amplas massas trabalhadoras.

"...os comunistas podem resumir sua teoria nesta fórmula única: a abolição da propriedade privada." [10]

As diferentes formas de desemprego

Sob o capitalismo, a superpopulação relativa (a massa de desempregados) assume diferentes formas, sendo necessário identificarmos as formas principais de maneira a identificar diferentes formas de abordagem e mobilização dos diferentes setores das massas trabalhadoras.

A superpopulação flutuante é constituída pelos operários que, devido à introdução de novas máquinas nas empresas, que dispensam a necessidade de um número elevado número de operários, são demitidos, bem como pelos operários que, em períodos de crise econômica e consequente redução da produção, são também demitidos. Fazem parte da superpopulação flutuante a jovem geração de operários que, devido à intensificação dos ritmos de trabalho nas empresas capitalistas, permanece desempregada durante um período mais ou menos prolongado. Fazem parte também da superpopulação flutuante aqueles operários apenas parcialmente empregados nas empresas capitalistas: com a crise e a consequente redução da produção, os capitalistas obrigam os operários a seguirem trabalhando nas empresas apenas poucos dias na semana, ou com jornadas reduzidas, recebendo por isto um salário muito inferior ao habitual. Durante a crise econômica que se iniciou no Brasil no ano de 2014, foi muito recorrente nas principais empresas capitalistas do país não apenas a demissão de grande parte dos operários, como também a manutenção de muito operários nas empresas, trabalhando porém em jornadas reduzidas e por menores salários.

A superpopulação latente (ou superpopulação agrária) é constituída pela grande massa dos camponeses arruinados que, diante dos baixos preços dos produtos agrícolas, do alto preço dos insumos, etc., tornam-se impossibilitados de seguir produzindo em suas terras e terminem enfrentando a ruína, vivendo uma vida miserável com uma produção praticamente de subsistência própria, tendo de viver de qualquer jeito nas zonas rurais para que tenham mesmo o mínimo para a sobrevivência da família. As estatísticas do desemprego frequentemente excluem das cifras dos desempregados a grande massa da superpopulação agrária, que aparecem como se fossem empregados no "setor primário" da economia, muito embora na prática sejam camponeses vivendo uma situação de desemprego completo ou parcial. A superpopulação agrária é também constituída pela enorme massa de assalariados rurais que, dado o caráter intermitente da produção agrícola nas grandes fazendas capitalistas, conseguem trabalho apenas de forma sazonal, por alguns meses do ano, permanecendo o resto do ano como desempregados ou semidesempregados. No Brasil, a superpopulação agrária constitui um exército de muitos milhões de miseráveis, encontrando apenas parcialmente uma saída para a melhora de suas condições de vida nos movimentos camponeses, que ocupam os grandes latifúndios semifeudais, improdutivos, cultivando-os pelas próprias mãos para escapar à fome e à miséria. Principalmente na região norte e nordeste do Brasil (bem como em regiões mais atrasadas do país localizadas no norte de Minas Gerais, no oeste paulista, nos "bolsões da miséria" do sul do Brasil, etc.), devido ao atraso técnico, à enorme dependência das condições naturais que frequentemente fazem eclodir secas ou inundações que varrem a produção agrícola, apenas parcialmente estes camponeses encontram-se empregados na agricultura ou na pecuária, formando na prática a enorme massa da superpopulação latente, desempregada ou semidesempregada. As populações originárias (indígenas e quilombolas em geral), barbaramente exploradas nas aldeias pelos latifundiários, madeireiros e as transnacionais capitalistas do agribusiness, reduzidas a terrível empobrecimento e sujeitas aos trabalhos não-pagos ou mal pagos nas grandes plantações, constituem também parcela importante da superpopulação latente no Brasil.

A superpopulação estagnada é constituída pelos operários desempregados já há muito desligados da produção capitalista, que vivem de bicos, trabalhos ocasionais, e que por via de regra recebem salários muito inferiores à média geral dos operários. Parte expressiva da superpopulação estagnada, devido à enorme miséria, busca encontrar suas fontes de renda na prostituição, no crime, e a parte ainda mais miserável desta superpopulação estagnada dedica-se à mendicância, vive uma vida de horrores e privações pelas ruas, dormindo nas vielas, embaixo dos viadutos das grandes cidades. Em nosso país, parte expressiva da superpopulação estagnada encontra-se obrigada a viver nas favelas, "áreas de risco" e bairros pobres. Pressionada pelos baixos salários e pelos enormes preços dos alugueis, pelos assédios do narcotráfico e da polícia genocida, grande parte da superpopulação estagnada se lança à luta pela moradia nas grandes cidades brasileiras, ocupando terrenos baldios e edifícios ociosos, utilizados pelos proprietários com puros fins de especulação. A superpopulação estagnada constitui grande parte da população desempregada não apenas no Brasil, como também nas grandes cidades até mesmo dos grandes centros imperialistas, como nos Estados Unidos, Europa ou Japão. Principalmente a partir de finais da década de 1970, a desindustrialização de importantes centros urbanos nos Estados Unidos, como Detroit, Chicago, Seattle, etc., expulsou milhões de operários para uma vida miserável de informalidade, de bicos e desemprego crônico, situação na qual até os tempos atuais a imensa maioria das famílias dos operários desligados da produção não podem dispor de um trabalho regular. A criminalidade e o comércio de drogas explodiu em proporção direta à da superpopulação estagnada. Nos países imperialistas, os operários migrantes compõem parcela importante da superpopulação estagnada.

O desemprego é consequência do uso das máquinas e da automação nas empresas?

Parte expressiva do movimento democrático em nosso país e no mundo, devido em parte à quase censura do marxismo nos círculos progressistas nas academias (substituído na cara dura por um "marxismo" catedrático e impotente, completamente apartado das massas e de suas lutas), nos movimentos sindicais, etc. tem adotado a ideia frequente segundo a qual a classe operária haveria deixado de cumprir o papel central nas mobilizações de massas, nas lutas políticas, e mesmo numa suposta Revolução. Muitos falam inclusive num suposto "capitalismo pós-industrial", onde haveria um suposto "esvaziamento dos espaços de luta do mundo do trabalho" no qual a suposta apatia das massas diante da arbitrariedade, da queda geral das condições de vida do povo, a nível mundial, residiria não nas concepções e atitudes equivocadas do próprio movimento popular no geral, mas no aumento do nível técnico das empresas, no maior emprego das máquinas e da automação nas empresas, substituindo o trabalho manual pelo trabalho mecânico ou automático. Circula entre os meios progressistas também a ideia de um suposto "fim do proletariado", de um "fim da classe operária", no qual a classe operária estaria sendo substituída por um "precariado", por uma amorfa "classe trabalhadora" ou por "trabalhadores do setor de serviços".

Tais grupos que compartilham de tais ideias e concepções não negam que a raiz das crises reside no modo capitalista de produção. Porém, se o capitalismo engendra as crises, seria devido à sua tendência de mecanizar e automatizar a produção. Há algo de verdade nisso?

No tomo I de O Capital, de Marx, o capítulo XIII "A maquinaria e a indústria moderna" discorre melhor sobre o assunto. Neste capítulo XIII, há dois subcapítulos, "A teoria da compensação dos trabalhadores desempregados pela máquina" e "Repulsão e atração dos trabalhadores pela fábrica, crises da indústria têxtil algodoeira", que entram diretamente em tal polêmica. Estas partes de O Capital são certamente úteis para compreender as relações existentes entre a substituição do trabalho humano pelo trabalho das máquinas, o desemprego e o capitalismo. Utilizemos alguns exemplos destes capítulos para compreendermos melhor o problema.

A lei fundamental do modo capitalista de produção não é definitivamente levar a cabo a produção de forma cada vez mais rápida e otimizada. A lei fundamental do modo capitalista de produção é a produção de mais-valia, da qual os capitalistas se apropriam mediante a exploração dos operários assalariados. Caso produzir de forma rápida e pujante, de forma otimizada e com máquinas mais modernas não seja rentável, não dê lucros aos capitalistas, permanecerão então empregando maquinários defasados em suas empresas. Na verdade, a baixa remuneração salarial da classe operária, decorrente das próprias leis do capitalismo, são um enorme empecilho ao avanço do nível técnico nas empresas capitalistas. Um capitalista sempre terá preferência em seguir empregando o trabalho de, por exemplo, cem operários, caso uma máquina que realize o trabalho destes mesmos cem operários com a mesma destreza seja mais cara que pagar o salário destes mesmos cem operários. Marx, em seu O Capital, observa que enquanto o movimento operário inglês não logrou por meio de suas lutas abolir o trabalho das mulheres e crianças nas minas de carvão da Inglaterra, os capitalistas proprietários das minas tinham preferência por utilizar o trabalho manual dos mineiros na extração do carvão. Somente após a abolição do trabalho infantil e feminino nas minas os capitalistas tiveram interesse em proceder ao emprego do trabalho mecânico e ao uso de máquinas, reduzindo assim os custos de produção e aumentando seus lucros.

Já dissemos mais atrás que o capital que um capitalista aplica em sua empresa se divide em duas partes: em capital constante (a parte do capital com a qual o capitalista compra meios de produção, isto é, matérias-primas, máquinas, combustíveis, eletricidade, instalações e galpões, etc.) e capital variável (a parte do capital com a qual o capitalista compra força de trabalho, isto é, contrata trabalhadores assalariados). Outro conceito extremamente importante para nossa investigação é o da composição orgânica do capital. A composição orgânica do capital significa a relação (divisão) entre a parte constante e variável do capital (c/v). Este é um conceito que nos permite compreender, de um lado, o quão produtivo (em termos proporcionais) é o operário, e de outro, a quantidade de operários que um capitalista deve contratar para viabilizar a produção. Suponhamos que um capitalista tenha de investir seu capital numa empresa cuja composição orgânica seja 3:1. Neste caso, 3:1 expressa que, para cada 3 que o capitalista invista na compra de meios de produção, deverá também investir 1 na contratação de trabalhadores assalariados. A composição orgânica 3:1 também significa que, por exemplo, 1 operário opera 3 unidades de meios de produção, 2 operários operam 6 unidades de meios de produção, e assim por diante.

Suponhamos que um capitalista, com um capital de 500, tenha de investir todo o seu capital numa empresa cuja composição orgânica seja 2:3. Neste caso, seu capital de 500 se dividirá em 200 de capital constante, e 300 de capital variável, numa composição orgânica de 200:300. Suponhamos que cada operário de sua empresa tenha um salário de 1. O capitalista, então, emprega 300 operários. Porém, para produzir mais e aumentar seus lucros, o capitalista resolve elevar o nível técnico de sua empresa, mudando a composição orgânica da empresa, que era de 2:3, para 4:1. Com o mesmo capital de 500, então, o capitalista investe 400 em capital constante e 100 em capital variável. Eis o que aconteceu: investindo atualmente 100 em capital variável, emprega apenas 100 operários assalariados, no lugar dos 300 que empregava com a velha composição orgânica do capital. Com uma empresa cuja composição orgânica atualmente se encontra em 4:1, e com um capital de 500, o capitalista deverá triplicar seu capital, de 500 para 1500, para que possa voltar em sua empresa a empregar os mesmos 300 operários que empregava antes. Com um capital de 1500 e uma composição orgânica de 4:1, seu capital se dividirá em 1200 de capital constante, e 300 de capital variável. Caso o capitalista resolva - por conta de um período de prosperidade econômica - aumentar seu capital de 1500 para 2000, mantendo-se a mesma composição orgânica de 4:1, seu capital dividir-se-á agora em 1600 de capital constante e 400 de capital variável. Então, o capitalista não emprega atualmente os mesmos 300 operários que empregava antes na velha composição orgânica, mas 400 operários. Houve um aumento absoluto no número de operários empregados na empresa, de 300 para 400, porém, uma diminuição relativa de 800 operários, pois com a atual composição de 4:1 e um capital de 2000, emprega 400 operários, e com a velha composição de 2:3 e com o mesmo capital de 2000, empregaria não 400 operários, mas 1200 operários, pois na composição orgânica de 2:3 seu capital dividir-se-ia em 800 de capital constante e 1200 de capital variável. De qualquer maneira, usando esta empresa como exemplo, podemos ver a confirmação das leis do capitalismo que engendram inevitavelmente as crises econômicas. Embora tenha havido um aumento absoluto da massa salarial de 300 para 400, ela decresceu relativamente, a massa salarial não acompanhou de nenhuma maneira o crescimento muito maior da produção. Na medida em que todas as empresas capitalistas procedem nesse sentido, faz-se ver num período de tempo mais ou menos curto o "excesso" de mercadorias, levando à crise de superprodução. Os capitalistas, que para aumentar seus lucros procediam na contratação de operários, agora devem demiti-los para reduzir no mesmo intuito de tentarem aumentar seus lucros.

Podemos observar desta maneira que as crises econômicas residem não num desenvolvimento maior da técnica, da mecanização e da automação nas empresas capitalistas, mas nas próprias leis gerais do sistema capitalista que intensificam os ritmos de trabalho e rebaixam os salários dos trabalhadores com o fim de aumentar os lucros dos capitalistas. No exemplo que demos acima, observamos que, para que o capitalista pudesse empregar 400 operários no lugar de 300, este teve que triplicar seu capital, isto é, triplicar a produção. Porém, os capitalistas muito raramente procedem no sentido de triplicar, quadruplicar ou quintuplicar a produção em suas empresas. As "incertezas do mercado", a pobreza das massas que gera necessariamente a escassez de consumidores para suas mercadorias, etc., não o compele os capitalistas a aumentar a produção em tal nível. A expansão da produção sob o capitalismo se dá sob os estreitíssimos limites do lucro privado, impedindo que a produção se expanda de maneira não apenas a reempregar os operários expulsos das empresas pelas máquinas e robôs, como inclusive de expandir a quantidade de operários empregados.

Portanto, se não apenas no Brasil como no mundo há uma expansão do "precariado", um maior aumento da população empregada no "setor de serviços", isso não se deve a uma "reestruturação" do capitalismo, de maneira que este tenha mudado de caráter, mas sim um reflexo direto de suas leis econômicas. A superpopulação estagnada (o desemprego permanente e crônico) expande-se grandemente, aumenta o número de miseráveis, de famílias inteiras que vivem de bicos, etc., pois o capitalismo não é capaz de reabsorver os trabalhadores expulsos das empresas pelo aumento do nível técnico. Ainda mais nas condições do imperialismo, do capitalismo monopolista, quando a burguesia busca sair das crises não apenas mediante a intensificação do trabalho para arruinar seus concorrentes, mas principalmente mediante a militarização, as guerras de agressão, o fascismo, e para isso tendo explorar ainda mais os trabalhadores mediante o aumento de todo tipo de impostos, diretos e indiretos, para que possa manter as guerras de agressão, a capacidade de consumo das massas se reduz ainda mais, e como consequência há um "excesso" relativo ainda maior de mercadorias, há um fenômeno de funcionamento crônico das empresas capitalistas abaixo de sua capacidade produtiva até mesmo em períodos da maior prosperidade.

Apenas nas condições do socialismo, nas condições em que os modernos meios de produção são propriedade não dos capitalistas, mas de todo o povo, a produção material deixa de se expandir sob os estreitos limites do lucro privado e agora, tendo como fim a satisfação das crescentes necessidades materiais e culturais das massas trabalhadoras, a produção pode expandir-se de forma ilimitada, e a mecanização e a automação podem igualmente desenvolver-se de forma ilimitada, dado que a ausência de limites na expansão da produção é a condição para que todos os trabalhadores tenham a certeza de um trabalho bem remunerado.

Algumas consequências da crise econômica sobre o aumento da exploração da classe operária brasileira

Desde o início da crise econômica de 2014, e particularmente após o Golpe de Estado efetuado pela quadrilha golpista de Temer em 2016, quadrilha esta diretamente bancada pelo imperialismo norte-americano, estes em conjunto com a grande burguesia brasileira e a classe latifundiária, têm tomado uma série de medidas para intensificar ainda mais a exploração desmedida do proletariado brasileiro.

Não é coincidência que contrarreformas monstruosas como a Reforma Trabalhista e a Lei da Terceirização tenham sido enfiadas goela abaixo das massas trabalhadoras num período de grave recessão econômica. Nas condições de crise, as classes dominantes se aproveitam da penúria da classe operária para explorá-la ainda mais.

De que maneira a Reforma Trabalhista e a Lei da Terceirização se relacionam com uma exploração ainda maior da classe operária?

A Reforma Trabalhista é a contrarreforma reacionária e anti-operária que, na prática, invalida qualquer lei que exista de proteção aos trabalhadores. É a contrarreforma na qual o "negociado prevalece sobre o legislado", ou seja, a "negociação" salarial entre o operário e o capitalista prevalece sobre a lei. Caso o operário e o capitalista "negociem", por exemplo, um salário inferior ao mínimo, jornada de 12 horas diárias sem folgas na semana, trabalho com o não pagamento de férias, 13º salário, contribuição ao fundo de aposentadoria, etc., o primeiro poderá trabalhar sob tais condições ainda que tais condições violem a lei trabalhista, dado que a "negociação" se sobrepõe. Acaso o operário teria prazer em sofrer, para "aceitar" condições tão terríveis de trabalho? Ocorre que, diante de um cenário de enorme desemprego, no qual os trabalhadores atravessam todo tipo de privações, mesmo os piores trabalhos, com as piores remunerações, são aceitas pelos operários para que possam por na mesa da família ao menos o pãozinho do café da manhã. Caso um trabalhador não aceite os termos do capitalista, para este não será de todo ruim: por conta da crise, pretende expandir a produção apenas de forma medíocre, não necessita contratar uma quantidade tão grande de operários, e além disso possui à sua disposição nos portões da empresa milhares dispostos a trabalhar sob condições ainda piores.

A Lei da Terceirização, por sua vez, liberaliza a terceirização ampla e irrestrita nas empresas, na medida que estas podem até mesmo terceirizar mesmo a contratação de operários empregados nas atividades-fim. Conforme as estatísticas demonstram, os operários contratados de forma terceirizada recebem, em média, um salário 1/4 inferior aos contratados diretos da empresa. São as principais vítimas dos acidentes de trabalho nas empresas e, além disso, estima-se que cerca de 76% dos resgatados em operações de combate ao trabalho escravo sejam trabalhadores terceirizados. Podemos usar o emblemático caso da corporação imperialista Unilever como exemplo: recentemente, quase 500 operários da fábrica da Unilever, localizada em Vinhedo - SP, entraram em greve contra as demissões na empresa e contra as ameaças dos patrões em terceirizar todos os cerca de 700 operários da fábrica. Parte dos operários já estão terceirizados. O sindicato local da fábrica denuncia que, enquanto um operário contratado diretamente pela empresa possui um salário mensal, em média, de 4 mil reais, um operário terceirizado recebe em média apenas 1,2 mil reais. Uma redução salarial não de 24%, como na média, mas de mais de 70%! Outro candente no cenário do proletariado brasileiro chama atenção. A cidade de Ouro Branco, em Minas Gerais, localizada na Grande Belo Horizonte, abriga uma grande fábrica siderúrgica da empresa Gerdau, onde trabalham ao menos 2 mil operários. Em menos de um ano, cerca de dez operários desta fábrica já morreram em decorrência de acidentes de trabalho, dos quais a maioria são terceirizados. Na última semana, a soldadora Elicleia Aquino da Silva morreu em decorrência da explosão na coqueira da fábrica, ocorrida em agosto deste ano. Elicleia foi a quinta morta na explosão, e não por coincidência era operária terceirizada da empresa Convaço, "prestadora de serviços" da fábrica da empresa Gerdau. Na explosão, morreu também o operário terceirizado Sandro Barbosa, que trabalhava para a terceirizada Oil Trade, também uma "prestadora de serviços" da Gerdau. Eis o que a grande burguesia e seus patrões imperialistas querem impor não a um punhado de trabalhadores, mas a todo o proletariado brasileiro!

Temer e sua turma de fascistas pretendem também em breve aprovar a "Reforma da Previdência" para, na prática, inviabilizar que os trabalhadores brasileiros tenham acesso ao direito da aposentadoria. Pretende-se que, após a Reforma da Previdência, os trabalhadores sejam constrangidos a uma idade mínima para a aposentadoria de 65 anos para os homens, e 62 anos para as mulheres, bem como um período de contribuição para a Previdência de 25 anos para o direito à aposentadoria parcial, e mais 24 anos para a aposentadoria integral. 49 anos de contribuição, obrigando na prática o trabalhador a continuar trabalhando mesmo após a conquista da aposentadoria parcial, para só então ter o direito de se aposentar! Num país em que a imensa maioria da população trabalhadora encontra-se imersa na informalidade e na incerteza, como será possível contribuir continuamente por 49 anos para a Previdência sem estar sujeito uma vez sequer ao desemprego, a um acidente de trabalho que impossibilite o operário de trabalhar por um período mais ou menos prolongado? Como se pretende que um professor continue dando aulas por 49 anos para só então conseguir uma aposentadoria integral? Como raios um camponês, trabalhando numa economia seminatural e sujeito a todo tipo de incertezas causadas por desastres naturais como as secas, inundações e pragas, poderá contribuir mensal e seguidamente por 49 anos para que consiga se aposentar? Há mesmo a menor possibilidade de um operário mineiro, trabalhador das minas subterrâneas, que trabalha todos os dias sob condições insalubres e temperaturas de cerca de 50 graus celsius, contribuir para a Previdência por 49 anos sem que morra por doenças ou acidentes decorrentes de trabalho antes de metade deste intervalo de tempo?

Todos estes pacotes de maldades não são meras maldades. Servem para atender aos interesses obscuros dos inimigos fundamentais do povo brasileiro. A Reforma Trabalhista e a Lei da Terceirização ampliam em sobremedida a intensificação dos ritmos de trabalho nas empresas e reduzem os salários. A Reforma da Previdência, por sua vez, tem como objetivo específico a ampliação do contingente da superpopulação relativa em nosso país, para abastecer não apenas os grandes capitalistas como principalmente as empresas do imperialismo com uma enorme torrente de operários assalariados mal remunerados. Dado que os trabalhadores aposentados, em tese, não fazem parte da superpopulação relativa, pois mantêm suas condições de existência por meios dos salários das aposentadorias e não são como desempregados que perambulam em busca de trabalho, aumentar o período de contribuição e a idade mínima para a aposentadoria significa restringir o acesso à aposentadoria para a imensa maioria dos trabalhadores brasileiros e, portanto, inserir os possíveis aposentados como parte da superpopulação relativa, desempregada, como forma de aumentar a oferta de força de trabalho aos capitalistas para rebaixar ainda mais os salários. É sabido que, no Brasil, os trabalhadores que possuem mais de 50 anos de idade encontram dificuldades muito maiores de serem reincorporados à produção ao serem demitidos. Relegar idosos ao desemprego significa pois aumentar em grande medida o contingente da superpopulação relativa.

Fala-se que, no Brasil, se está a levar a cabo um "capitalismo sem consumidores", e que a grande burguesia brasileira seria uma "burguesia burra" por estar supostamente trabalhando contra os próprios interesses, dado que a longo prazo tais reformas minariam o próprio mercado consumidor. A grande burguesia brasileira não é de fato uma burguesia burra, mas uma burguesia compradora, fantoche do imperialismo norte-americano. Pouco importa para esta se o mercado consumidor brasileiro se empobrece ainda mais, pois seus mercados não se encontram aqui, mas no exterior. Esta grande burguesia, mediante a corrupção e o recebimento de milhões de dólares em propinas dos gringos, aprova todo tipo de medidas anti-operárias, draconianas, para que o imperialismo amplie sua dominação sobre nosso país e nosso povo. Para os imperialistas, é favorável a compressão brutal dos salários dos operários brasileiros: pode-se pagar uma mixaria aos semi-escravos coloniais sedentos por trabalho e esmagados pela miséria apenas para se aproveitar da mão de obra barata dos mesmos, forçá-los a montar os componentes importados dos centros imperialistas, e reexportá-los para o exterior, reduzindo os preços das mercadorias, tornando-as "competitivas" em decorrência dos baixos salários do operariado brasileiro.



Notas

[1] “Desemprego leva multidão a disputar 200 vagas em shopping no Rio de Janeiro”: http://www.horadopovo.com.br/2017/09Set/3567-01-09-2017/P2/pag2d.htm

[2] Manifesto do Partido Comunista.

[3] Utilizamos aqui o termo “lucro” de forma ainda inexata, pois o excedente que o operário produz na empresa capitalista, excedente do qual o capitalista se apropria, não é o “lucro”, mas a mais-valia. A mais-valia, produzida pelo operário na empresa capitalista, não ficará inteiramente com o capitalista proprietário da empresa. Caso o capitalista, por exemplo, tivesse ele próprio de vender as mercadorias produzidas em sua empresa, teria de gastar um montante ainda maior de seu capital para a construção de lojas, para obter contatos de venda com compradores, etc., razão pela qual o capitalista prefere ceder sua mercadoria a um comerciante – que se especializa apenas na venda das mercadorias, e não na produção das mesmas – que se encarregará de vender as mercadorias do industrial, em razão da qual poderá se apropriar de um determinado montante da mais-valia produzida na empresa do industrial capitalista. Dado também que o capitalista industrial não pode dispor de capital para abrir uma empresa capitalista através de suas economias pessoais, só pode dispor deste capital mediante a tomada de um empréstimo no banco, permitindo assim ao banqueiro se aproprie também de parte da mais-valia produzida pelo industrial sob a forma de juro. Dentre os capitalistas industriais que alugam os terrenos das fábricas, dos galpões, devem também permitir que o proprietário do terreno se aproprie de parte da mais-valia sob a forma de renda da terra, isto é, por meio do pagamento do aluguel. Neste sentido, podemos esquematizar como a mais-valia, produzida na empresa capitalista, é apropriada pelos diferentes setores da burguesia: parte dela ficará com o industrial (renda industrial); outra parte será apropriada pelo comerciante (lucro comercial); outra pelo banqueiro (juro); e outra pelo proprietário da terra (aluguel, ou renda da terra).

[4] Para simplificar a questão, partiremos apenas da premissa da ruína e da proletarização dos camponeses e artesãos, desconsiderando aquela parcela minoritária camponeses e artesãos que, longe de se arruinarem, prosperam e se tornam capitalistas.

[5] Eis aí também o que significa dizer que, com o desenvolvimento do capitalismo, "a produção assume um caráter cada vez mais social". Enquanto nos períodos pré-capitalistas, por exemplo, todos os bens de consumo necessário à sobrevivências das massas trabalhadoras podiam ser todos produzidos pela mão dos membros de uma mesma família, no quintal da própria casa, sob o capitalismo só é possível produzir estes bens necessários às massas pondo em movimento milhões e milhões de operários, não apenas de um único país como até mesmo - principalmente nos tempos atuais - de muitos países, regiões e continentes inteiros.

[6] Para simplificar a questão, estabelecemos apenas a classe operária como mercado consumidor de bens de consumo. Sabemos que com o desenvolvimento do capitalismo, porém, o mercado consumidor se estende também a vastos setores da pequena burguesia, dos camponeses, e também da burguesia, setor este que, ao lado dos bens de consumo usuais, consome também produtos de luxo. Todavia, independentemente desta constatação, sob o capitalismo a classe operária constitui-se sempre como o principal mercado consumidor, não apenas por ser o operariado o principal contingente numérico da sociedade capitalista, como também pelo fato de a capacidade de consumo de todas as outras classes, incluindo a burguesia, ser dependente em última instância do consumo dos operários.

[7] Conhecida também pelo marxismo como "exército industrial de reserva".

[8] Manifesto do Partido Comunista.

[9] Compreendendo-se que a razão da crise do capitalismo reside na miséria das massas trabalhadoras, miséria essa que as próprias leis do capitalismo criam. Diante deste fato, ao longo dos séculos apareceram diferentes teorias burguesas que defendiam que, longe de possuírem interesses de classe antagônicos, tanto a burguesia quanto o proletariado estariam interessados da mesma maneira do crescimento da produção capitalista. Diziam tais teorias que, dado que os capitalistas têm como principal mercado a classe operária, os capitalistas estariam interessados no aumento dos salários dos operários, pois sem que estes tivessem seus salários aumentados, os capitalistas não teriam para quem vender suas mercadorias. Por esse motivo, diziam tais teorias, os capitalistas manifestariam interesse no aumento dos salários dos operários, pois o aumento dos salários levaria à expansão do mercado interno, e sendo assim os capitalistas teriam de forma infinita a expansão do mercado para a venda das mercadorias. Outras teorias do reformismo burguês, por exemplo, defenderiam a necessidade de "taxar as grandes fortunas", estabelecer um imposto progressivo sobre os grandes capitalistas, para assim formar um fundo de redistribuição entre a população trabalhadora, para que esta possa prosseguir consumindo. É evidente que o aumento dos salários cria um maior mercado interno para a produção capitalista, as mercadorias circulam com mais rapidez, a produção pode se expandir mais rapidamente, etc. Porém, sob as condições do modo capitalista de produção, cada capitalista se preocupa apenas com seus próprios lucros, e não poderia ser diferente diante destas condições em que os meios de produção são propriedade privada dos capitalistas. Caso os capitalistas resolvessem aumentar os salários dos operários, ou colocassem algum freio à intensificação dos ritmos de trabalho para melhorar as condições de vida dos operários para que estes comprassem mais, outros capitalistas, concorrentes seus, que rebaixam os salários e intensificam os ritmos de trabalho, produziriam mercadorias muito mais baratas, que arruinariam o capitalista que procedeu no sentido de melhorar as condições de vida de seus operários. Para que este não se arruíne, deverá proceder como os outros e reduzir os salários de seus operários, intensificar os ritmos de trabalho, e com todos os capitalistas assim procedendo, desenvolvem-se as condições para a eclosão das crises capitalistas. Até mesmo nas condições do capitalismo monopolista contemporâneo, em que um pequeníssimo punhado de gigantescas empresas capitalistas dividem o mercado entre si, essa concorrência não cessa e, além disso, se aguça ainda mais. Cada capitalista busca o impossível: controlar sozinho todo o mercado nacional e, caso possa, todo o mercado mundial. Os diferentes monopolistas capitalistas seguem no sentido então de rebaixar os salários e intensificar os ritmos de trabalho, tornando ainda mais intensas as crises capitalistas sob nossos dias.

[10] Manifesto do Partido Comunista.


[ARTIGO ORIGINALMENTE ESCRITO EM DEZEMBRO DE 2017]

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